terça-feira, 19 de julho de 2011

Aqui “jaz” a Villa Augusta. Salvador Bahia, Graça

Assim como no Bairro da Vitória mais um casarão pode desaparecer e junto levar o verde, sua História e o sossego.
 Imagem da fachada do casarão denominado Villa Augusta na Avenida Princesa Isabel, Graça.
Imagem: Rafael Dantas.
 

Texto: Rafael Dantas, Bahia.

É interessante e ao mesmo tempo triste, ver como as coisas são catalogadas, avaliadas, ou mesmo destruídas. Os critérios para querer derrubar algo são os mais diversos, vão desde “em nome do avanço (progresso)”, ou mesmo: “em nome do dinheiro”. E no caso os dois exemplos sempre estiveram muito próximos. Resumindo, por todo lugar que olhamos o que observamos é o avanço de ideias e projetos, sobre aquilo que não é mais aceito ou que simplesmente não da mais dinheiro.
 
Toda essa introdução realística e triste da nossa sociedade é para mostrar como o que foi construído em tempos passados é hoje ignorado ou mesmo demolido. E tal introdução implica-se diretamente em mais um grande empreendimento que será lançado no bairro da Graça, para ser mais preciso na Avenida Princesa Isabel, onde hoje temos um belo casarão n° 31, e um vasto terreno com muito verde. Tanto o casarão citado como o “muito verde”, não é garantido de ser visto no futuro. A mansão que lá está é um casa de dois andares de janelas verdes que aparenta ter sido construída, ou ter passado por uma reforma, em meados do século XX. Infelizmente nenhum desses dados assegurou a preservação do casarão. E outras tantas construções antigas - ou mesmo históricas - continuam sendo demolidas em Salvador, como pode ser visto em texto publicado neste blog: http://rafaeldantasbahia.blogspot.com.br/2013/05/demolindo-propria-historia-o-descaso.html
 
Imagem dos futuros prédios (em construção) da Villa Augusta.
E o que será a entrada do condomínio, onde hoje temos o casarão.
Imagem: OLX.


O casarão possui algumas características especiais, destacando-se uma divisória, na verdade um muro em forma de voluta, logo em sua fachada que parece dividi-la. A murada de entrada chama muito a atenção, com várias colunas, onde as escadas de acesso passam entre elas e direcionam até a fachada. Outro ponto interessante é o fato de existir uma balaustrada em cima desse muro, que é o próprio terreno elevado. Especialmente podemos notar nos balaústres certa particularidade que não é vista em outras construções no Bairro da Graça e redondezas, podendo ser um dos últimos exemplares da região. O gradil em ferro, típico do século XX, está em bom estado de conservação, assim como toda a casa aparentemente.

Um dos destaques vai justamente para as velhas árvores que ficam em frente à residência, trazendo para que avista a antiga mansão uma  profundidade no terreno. E falando em árvores, é o que encontramos em maior quantidade em todo a propriedade, que por sinal é muito grande.
Imagem da fachada do casarão Villa Augusta com o alvará de Construção!
Destaque para a pilastra central com o antigo nome “Villa Augusta” e a murada com os balaústres.
Imagem: Rafael Dantas

Por todos os cantos que olhamos encontramos o verde no terreno, seja a parte que leva da entrada para a garagem, ou os fundos do terreno que encontra com a Rua Oito de Dezembro, também no bairro da Graça. É mais que visível a quantidade de árvores de grande e médio porte existente na propriedade onde será construído o empreendimento. Claro que nesse lugar quase que esquecido, entre os vários edifícios do Bairro da Graça, tanto a casa como o verde, deveriam ser vistos com outros olhos, e não com os olhos do: “a qualquer preço” do mercado imobiliário, como está sendo visto agora.
Imagem capturada da Rua Oito de Dezembro, podemos ter uma ideia da dimensão do terreno.
Percebemos também as várias árvores, inclusive bananeiras.
Imagem: Rafael Dantas

Os fundos do empreendimento voltado para a Rua Oito de Dezembro.
A vegetação em volta do terreno é ilustrativa.
Na verdade o que temos são vários prédios.
Imagem OLX.

Fazendo uma singela análise do Bairro da Graça podemos perceber que são poucos os casarões que conseguiram sobreviver ao avanço dos grandes edifícios. Na própria Avenida Princesa Isabel a maior casa construída no período citado é a que hoje está ameaçada. Os outros casarões em destaque são: o que fica ao lado do Hospital Português, e que milagrosamente ainda esta de pé, e abaixo do casarão (o ameaçado) onde será construída “A Mansão Villa Augusta”, temos outras pequenas casas, de meados do século XX, onde inclusive funciona a famosa sapataria do “Valdemar Calçados”. E no restante de toda a Avenida uns poucos casarões, muito bonitos, mas construídos de meados do século XX em diante, que também possuem suas singulares características: como a casa com a fachada rodeada de azulejos, que fica abaixo do Edifício Módulo, conhecido como “prédio redondo”.
 
Outro ponto de destaque, esse sem dúvida pesará mais para os moradores, é o fato do constante engarrafamento principalmente nos horários de pico, na Avenida Princesa Isabel. Fato é que depois da instalação da “Perini”, uma espécie de mercearia de grande porte, que fica onde antes tínhamos a tradicional Sede do Clube Baiano de Tênis, os engarrafamentos só pioraram, afinal temos agora um grande estacionamento no local da própria Perini. Então se hoje na Avenida Princesa Isabel os motoristas enfrentam todos esses transtornos, imagina se forem construídos os dois prédios do projeto divulgado, cada um com uns vinte andares ou mais, custando a partir de R$ 1.200.000,00 reais cada apartamento, chegando a custar 4 milhões a cobertura! Para se ter uma ideia até a pacata Rua Oito de Dezembro enfrenta problemas neste sentido.
 
O nome do novo empreendimento será como mencionado: Mansão Villa Augusta, e o mais curioso é que em uma das pilastras - na verdade na pilastra central do antigo casarão - temos justamente uma placa em alto relevo com esse mesmo nome, denominando a própria casa que lá existe e que já fora detalhada nesse texto. Até ai claro, entendemos que o novo empreendimento irá homenagear a casa ou a “Villa Augusta”, que ainda existe no lugar. Mas, o curioso é: ‘será nos escombros, produzidos intencionalmente, que uma "homenagem" póstuma, será aplicada’. Afinal a antiga mansão, a maioria das árvores e a memória visual do lugar, virará apenas recordação, ou diretamente falando: Escombros de um Bairro da Graça, ainda com suas grandes mansões, que notabilizaram o lugar, e hoje são tratadas como meras construções a disposição da triste demolição.

O alvará e o nome "Villa Augusta" que ali esteve durante décadas.
Uma das grandes contradições, o que será que vai acontecer?
Infelizmente a resposta poder ser vista atualmente no lugar. Imagem: Rafael Dantas.


*Importante lembrar que a residência pertenceu à família e depois ao próprio Thales de Azevedo, grande médico, professor e intelectual baiano. T. Azevedo nasceu em 26 e agosto de 1904, sendo filho de Ormindo Olympio Pinto de Azevedo e Laurinda Góes de Azevedo. Estudou no Colégio Antônio Vieira, e teve como colegas: Anísio Teixeira, Hélio Simões e Francisco Mangabeira.
 
Em 1922 ingressou na Faculdade de Medicina da Bahia, diplomado em 1927, teve entre colegas de turma: Bráulio Xavier Filho, Carlos Rodrigues Moraes, Hosanah de Oliveira, Jorge Valente e José Silveira. Foi revisor do Diário Oficial da Bahia e do Jornal A Tarde.  Outro ponto relevante é seu ingresso na Faculdade de Filosofia, Ciências Sociais e Letras, criada em 1941. Dentre seus trabalhos destacam-se o “Povoamento da Cidade de Salvador”, obra que o credencia para dirigir a primeira Cadeira de Antropologia e Etnografia do Brasil, na Faculdade de Filosofia da Bahia.
Em sua vida vários foram os fatores que ajudaram a tornar Thales de Azevedo um dos antropólogos e etnólogos mais importantes do Brasil ao lado de outros vultos da Bahia. Faleceu em cinco de agosto de 1995. E lamentavelmente tudo indica que sua casa irá desaparecer em 2013 ou 2014.
 
No site http://www.thalesdeazevedo.com.br/fotos.htm podemos encontrar a galeria de fotos onde Thales de Azevedo é fotografado em seu ambiente de trabalho, possivelmente na Villa Augusta. Além de fotografias da família, na própria residência que pertencia aos pais de T. Azevedo, o que pode indicar o período de sua construção, sendo no início do século XX ou mesmo antes.
Atualmente a casa funciona como escritório ‘temporário’ de vendas do empreendimento, que será lançado no local onde está o casarão. É possível ver dois quadros dos antigos donos da casa na entrada. A memória de décadas hoje se resume ao grande painel de venda dos futuros apartamentos.  

Fontes e Agradecimentos:
Site OLX. (Imagens)
Thales de Azevedo.com (Dados biográficos). E:
Médicos Ilustres da Bahia (Blog).

4 comentários:

  1. Na casa da direita, até a década de 1970, morava Ângelo Calmon de sá.

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  2. Qual a posição de Maria Brandão, Socióloga urbanista e Paulo Ormindo, arquiteto,ambos filhos de Thales sobre o problema?

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    1. Não tenho conhecimento Fátima Falcão.
      A intenção de escrever esse texto foi a tentativa de alertar sobre a preservação de um dos últimos casarões da Graça - lugar que infelizmente sofreu drásticas transformações. Em minha opinião a Villa Augusta era um significativo elemento para a história visual do bairro, lugar onde viveu um importante nome para a Bahia, que foi o Thales de Azevedo. Na época da postagem do texto, o casarão não tinha sido demolido, atualmente no lugar não resta mais nada.

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